Sento-me.
As cadeiras de pele fazem um certo ruído.
Uma senhora desliga o telemóvel enquanto outra mais à frente acena a alguém lá atrás, enquanto o senhor que está ao lado olha atentamente para o tecto, uma menina ruiva tosse compulsivamente até ao espectáculo começar, e durante o espectáculo mais tosses de cão acompanham os actores, numa sinfonia constante. Abstraio-me. Os olhos atentos absorvem gestos e palavras, algumas pessoas segredam piadinhas ao parceiro do lado enquanto decorre a mudança de cena, outras preferem guardar as piadas mas mesmo assim aproveitam para mandar um sms. O espectáculo tem um intervalo de quinze minutos, as pessoas saem lentamente, algumas pensativas, outras tiram o cigarro da mala, esquecem-se da tosse compulsiva. O espectáculo recomeça, o alcatrão faz cocegas constantes nas gargantas de alguns, as tosses invadem a sala mais uma vez, as lágrimas balançam nos olhos de uma idosa bem vestida, mas o alívio cómico provoca-lhe uma gargalhada bastante sonora e exagerada. O espectáculo acaba, alguns temem levantar-se para não serem os únicos. Eu levanto-me na companhia de alguns destemidos, a plateia completa está de pé.
A sociedade está com medo de sentir.
Je t'aime (moi non plus)
Há 12 anos
5 comentários:
Foste ver a peça ou o comportamento da população portuguesa quando tenta culturizar-se
Realmente, a noção da aculturação da nossa sociedade passa por assistir a dez horas de Morangos com Açúcar por dia, cinco ou seis daquele Big Brother novo que aí há e umas três de comer Mc Donalds.
Estamos num bom caminho, é certo...
Enfim, a sociedade não sei se estará, mas as tuas produções escritas estão com certeza.
:)
Concordo veementemente com a sophia! Os tuas criações estão visivelmente melhores! ;)
devo dizer que axentos de pele são constrangedores, mx a verdade e que o "POVINHO" é mais...
raquel...
raquel...
raquel...
...
São as pessoas que sentam no escuro, na entrega de prémios. São aqueles que estão lá pelo lugar em que sentaram e não pelo espectáculo
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