28/05/2007

Leonor

“Porquê?” pensou ela quando sentia a garganta inchar, como se esta lhe impedisse de respirar normalmente. Os pensamentos desordenados insistiam em confundir ainda mais a sua cabeça cansada e farta de procurar.
Já não era a primeira vez que tal que lhe acontecia. Desde que se lembrava existir, um vazio visitava-lhe o íntimo, e admiravelmente este vazio, sendo vazio de todo, conseguia na maioria das vezes ocupar bastante espaço. Era como uma bolsa de ar, um balão de angústia, um saco cheio de medo, ou até mesmo uma cápsula de insegurança que ocupavam o seu interior. Uma Rapariga de personalidade forte, mas mesmo assim frágil, apreciadora das coisas mais simples, e sonhadora de natureza, vagueava por um terreno cheio de tudo e de nada, tal como ela se sentia naquele momento, cheia de tudo e de nada. O Terreno podia estar cheio de flores e verduras, mas estava vazio de significados e lembranças, e ela, encontrava-se cheia de sentimentos e fantasias, mas vazia de palavras. Lembrou-se dos rios de lágrimas que havia derramado dias e dias, intercalados por fumo que amarelavam os cortinados do seu quarto e músicas de êxtase que lhe moviam o corpo. Lembrou-se de beijos quentes e toques suaves, de um olhar doce, de uma voz calmante, lembrou-se da música perfeita, lembrou-se de tudo quanto achava que lhe fazia bem á alma, mas para seu desgosto, nem a bolsa de ar, nem o balão de angústia, nem a cápsula de insegurança lhe largaram o peito. Finalmente lembrou-se de observar com mais atenção ainda o terreno em sua volta. “Observa tudo o que está a tua volta como se fosse a primeira vez”, tinha lido esta frase algures, e ao lembrar-se dela uma réstia de calor lhe acalmou por segundos o coração. Sentiu-se insensível á natureza que nunca lhe cativara especialmente, talvez por não compreender o seu ponto de vista, mal explorado e estranhamente bizarro. Olhou então no vazio, e tentou sentir, sentir apenas, porque a apatia nestas alturas espreitava-lhe por cima do ombro, e o abstracto confuso sussurrava-lhe aos ouvidos.
Sentia-se fatigada. Deitou-se então na relva húmida, e pensou que toda a calmaria que pairava sobre terreno, não lhe estava a reconfortar, apenas acentuava a solidão que prometera á sua vida uma eterna estadia.
Sabia que não precisava de desabafar, mas sim de gritar até a sua garganta sangrar. A Rapariga então levantou-se de rompante mas ao fechar os punhos e os olhos com força, esperando um grito de socorro, a única coisa que conseguiu reproduzir tinha sido um guincho quase mudo, rouco, medroso e cobarde.
“É o fim.” Pensou ela enquanto corria pelo campo fora. As suas pernas corriam, mas ela não sabia para onde estas lhe levavam, tentou desobedecer aos seus membros inferiores mas não lhe valeu de nada. As suas pernas subiam agora pelas escadas da casa dos seus avós, e as pernas só lhe obedeceram finalmente, quando chegou á casa de banho do seu quarto. Olhou-se ao espelho e observou os seus olhos verdes, o cabelo desalinhado e o suor que lhe escorria pela testa. Não se reconheceu por instantes, e quase se assustou com a rapariga quase mulher que arfava á sua frente, mas logo a seguir reconheceu a menina desesperada que lhe pedia ajuda sem falar através do espelho. “É o fim.” Disse novamente ela, enquanto estancava o sangue nos pulsos, e chorava compulsivamente. Olhou-se uma última vez ao espelho, e ao mesmo tempo vislumbrou a imagem da sua irmã gémea. “Acabou-se a solidão Leonor…”
Aqui jaz Teresa abraçada á sua irmã Leonor.

22/05/2007

Café

Cuidado! - Gritou Sara - Olha o café estava a ferver Vera! – Hum, sou eu Sara…- respondeu o rapaz enquanto procurava um lenço para limpar a mão de rapariga - Desculpa para a próxima tomo mais atenção! – disse Francisco olhando para Sara como se fosse a primeira vez – Apanhas o autocarro a que horas miúda?Seis e meia talvez… - respondeu Sara.
Não acredito! O Hemingway também é um dos meus autores favoritos– Responde Sara numa gargalhada contagiante. Toma este Livro Sara, não é do Hemingway mas não deixa de ser muito bom, acho que vais adorar! Obrigada! – respondeu ela – Sabes que adoro ler…hum…Alta vigilância, obrigada mesmo! – De nada! – despediu-se de Sara com dois beijinhos, e seguiu caminho.
Chegando a casa, depois de tomar um banho refrescante, Sara pegou no livro e iniciou a sua leitura. Francisco estava mais simpático, mas o seu ar galanteador nunca lhe agradara.
Põe a mesa filho! – exclamou a mãe de Francisco da cozinha assim que ele chegou. – Calma deixa-me ir num instante a casa de banho! – Lavou a cara e ao olhar-se ao espelho reparou que os seus olhos negros estavam estranhamento brilhantes, as faces mais rosadas que do que era costume, e os seus lábios carnudos pela primeira vez na vida lhe pareceram bonitos. – Que se passa contigo Chico? Han? Diz lá! – Perguntou ele ao seu reflexo no espelho. Francisco colocou os talheres e os pratos na mesa da sala de jantar e os guardanapos dobrou-os de forma a enfeitarem os copos. A lasanha agradava a todos os elementos da família, incluindo o pai de Chico, que na maioria das vezes pedia um bife mal passado. – Então Chico perdes-te o piu? – perguntou a irmã com uma expressão de troça. – Maria, e que tal relaxares as hormonas? - Francisco!!! – Exclamou a Mãe em alto e bom som, enquanto Chico se ria despreocupadamente. Pronto já cá não está quem falou! – Respondeu Maria deixando a mesa sem pedir licença. Francisco estava a menos de cinco minutos, deitado com as mãos atrás da cabeça, quando Paula, sua mãe entra no quarto com um copo de leite na mão. – Toma filho. Gostava de ter uma conversa contigo. – Sou todo ouvidos. – Respondeu Chico dando um pequeno golo no leite morno e doce.Que se passa contigo bebé?Não me trates assim mãe! – Não agradava nada a Chico quando a mãe se tornava demasiadamente carinhosa. – Nada. Simplesmente estou feliz, tenho tirado boas notas, o que é raro…e estava aqui a pensar: Não te sentes pequena se pensares que Deus não existe, ou melhor, não te sentes poderosa se pensares que és uma parte de Deus? - Não comeces com as tuas conversas filosóficas! Tens a certeza que é só isso?Claro que sim mãe, não te armes em santo António casamenteiro novamente! – Responde Chico em tom de brincadeira. - Ok chiquinho, não te chateio mais. – Paula fechou a porta com um sorriso, e Chico pensou mais uma vez na menina do sorriso lindo, como ele se atrevera a chamar Sara na sua última "sms" de boa noite.
Sara foi a primeira pessoa que Chico viu na manhã seguinte, porém não da forma que gostaria de ver. Lá estava ela a falar sorridente e aparentemente feliz com o seu colega Afonso. Bom dia Sara! – exclamou Francisco, fingindo ignorar Afonso que lhe acenou em vão.
Porque é que o ignoras-te? – Perguntou Sara de cara séria a Francisco que comia um gelado fazendo-se parecer despreocupado – Passou despercebido miúda, que é queres? – Francisco não queria fazer notar o seu coração que batia descompassadamente, enquanto ele observava o cabelo negro de Sara que nesse dia estava surpreendentemente mais brilhante e bonito.
Gosta de ti! Mas…Oh Sara não tens de fazer um filme com isso, és uma miúda bonita, inteligente, culta, não és fútil. Conhecendo o Chico como eu conheço, ele deve estar farto de “morangadas”, e talvez esteja interessado numa relação séria. Não menosprezes os sentimentos do rapaz! – Exclamou Íris arregalando os olhos, depois de Sara lhe contar a nova atitude de Chico. Achas que deva falar com ele? – Questionou Sara, enquanto pegava no telemóvel – olha! Outra mensagem dele! – Exclamou. Não sei…- Respondeu Íris. – Talvez…mas tem cuidado, fala coerentemente, não te arrisques a perder uma amizade de anos.
Sim é verdade Sara, sinto algo que nunca senti antes…- Francisco ainda não estava a acreditar que Sara acabara de descobrir o seu recente sentimento em relação a ela. Eu não vou mudar de atitude perante a tua amizade Chico, só queria confirmar! – Exclamou Sara constrangida com o embaraço do rapaz. Eu sei, por isso é que fui sincero contigo! – retorquiu ele.
Passaram-se meses, e apesar da conversa entre Sara e Chico ter sido extremamente sincera e leal, a relação de amizade dos dois não voltou a ser a mesma. Afastaram-se ambos, e assim Francisco sentiu a “paixoneta” por Sara arrefecer gradualmente.
Chegaram finalmente as férias de Verão, e Sara estava radiante com a notícia dos pais:
Férias na Austrália? Uau mãe!
E assim se passaram duas semanas inesquecíveis na companhia dos pais, que lhe deixavam passear pelo hotel á noite. Sara adorava as noites de Karaoke, e a facilidade com que havia feito novos amigos ajudara-lhe imenso a passar as melhores férias da sua vida. Bryan, o rapaz mais extrovertido do grupo de amigos de verão fazia-lhe lembrar Francisco, e estranhamente o seu estômago dava uma volta sempre que se lembrava do amigo. Mas o último dia tinha chegado…- Mostra o cartão do hotel ao senhor no balcão, filha.Disse o pai á rapariga que deitava distraidamente um último olhar ao hotel. Sara!!! Sara! – Era a voz de Francisco! E lá estava ele, junto da escadaria do hotel. Sara correu ao seu encontro. – Francisco? Tu aqui? – Não sabia porquê, mas a felicidade e adrenalina tinham tomado conta do seu íntimo, e com a excitação, Sara nem tinha reparado na rapariga loira que estava ao lado do rapaz. Sara, é a minha namorada, Matilde, esta é a minha amiga sara!Prazer! – responderam as duas em uníssono. Após o trio se despedir, Sara juntou-se aos pais, e abandonou o hotel.
O avião levantou voo, e os seus olhos foram invadidos pelas lágrimas de desilusão. Fui tão estúpida! – pensou ela, enquanto amachucava raivosamente o desenho que pormenorizadamente traçava durante a viagem, e que por vezes voltava a retocar. Era o rosto de Francisco que acabava de ser destruído pelas suas mãos, mas não pelo seu coração.

19/05/2007

today I'm totally happy

Mais do que harmonia, bons sentimentos concentrados num núcleo vibrante, danças frenéticas acompanhadas de boas vibrações. Sim é uma boa definição de duas horinhas e tal de calor humano, humanos que amam música e quando eu digo música é MÚSICA a sério.

Nem mais...

14/05/2007

O Pianista




Outra tema que sempre me agradou: II Guerra Mundial




E este filme "O Pianista", tornou-se O eleito. As imagens, a realidade irrecusável pelo passado, a força de viver do ser humano em circunstâncias de extrema falta de mínimas condições para sobreviver quando foge do gueto de Vársovia após a deportação de toda a sua família para os campos de concentração alemães. Um artista, sensível, apaixonado acima de tudo pela vida, observa a decadência gradual, o reflexo da guerra na sua própria pele e na daqueles que mais ama.




E se pensarmos que este não é um passado distante, é até bastante recente...


Nos dias de hoje o caminho está livre.

08/05/2007

Espinosa

Nome engraçado, pertencente a comunidade judaica, natural de Amesterdão.
Achava que dogmas rígidos e rituais exteriores mantinham o cristianismo e o judaísmo vivos, e...eu concordo plenamente, não só concordo com este aspecto como me identifiquei com todos os seus pontos de vista.
Se pensarmos que somos apenas uma partícula minúscula de toda a vida da natureza e provável que nos inquietemos com esta hipótese, mas se colocarmos um sinal igual entre a natureza e Deus talvez tudo se torne mais claro. Sim, é algo panteísta mas para mim faz todo o sentido o facto de Deus não ser alguém que criou o mundo e que está desde então junto á criação, não...Deus é o mundo. Enfim até ficava aqui a escrever mais e mais, mas os meus olhos estão neste momento a pedirem fim de expediente.

Obrigada Sofia Amundsen hihihi