22/05/2007

Café

Cuidado! - Gritou Sara - Olha o café estava a ferver Vera! – Hum, sou eu Sara…- respondeu o rapaz enquanto procurava um lenço para limpar a mão de rapariga - Desculpa para a próxima tomo mais atenção! – disse Francisco olhando para Sara como se fosse a primeira vez – Apanhas o autocarro a que horas miúda?Seis e meia talvez… - respondeu Sara.
Não acredito! O Hemingway também é um dos meus autores favoritos– Responde Sara numa gargalhada contagiante. Toma este Livro Sara, não é do Hemingway mas não deixa de ser muito bom, acho que vais adorar! Obrigada! – respondeu ela – Sabes que adoro ler…hum…Alta vigilância, obrigada mesmo! – De nada! – despediu-se de Sara com dois beijinhos, e seguiu caminho.
Chegando a casa, depois de tomar um banho refrescante, Sara pegou no livro e iniciou a sua leitura. Francisco estava mais simpático, mas o seu ar galanteador nunca lhe agradara.
Põe a mesa filho! – exclamou a mãe de Francisco da cozinha assim que ele chegou. – Calma deixa-me ir num instante a casa de banho! – Lavou a cara e ao olhar-se ao espelho reparou que os seus olhos negros estavam estranhamento brilhantes, as faces mais rosadas que do que era costume, e os seus lábios carnudos pela primeira vez na vida lhe pareceram bonitos. – Que se passa contigo Chico? Han? Diz lá! – Perguntou ele ao seu reflexo no espelho. Francisco colocou os talheres e os pratos na mesa da sala de jantar e os guardanapos dobrou-os de forma a enfeitarem os copos. A lasanha agradava a todos os elementos da família, incluindo o pai de Chico, que na maioria das vezes pedia um bife mal passado. – Então Chico perdes-te o piu? – perguntou a irmã com uma expressão de troça. – Maria, e que tal relaxares as hormonas? - Francisco!!! – Exclamou a Mãe em alto e bom som, enquanto Chico se ria despreocupadamente. Pronto já cá não está quem falou! – Respondeu Maria deixando a mesa sem pedir licença. Francisco estava a menos de cinco minutos, deitado com as mãos atrás da cabeça, quando Paula, sua mãe entra no quarto com um copo de leite na mão. – Toma filho. Gostava de ter uma conversa contigo. – Sou todo ouvidos. – Respondeu Chico dando um pequeno golo no leite morno e doce.Que se passa contigo bebé?Não me trates assim mãe! – Não agradava nada a Chico quando a mãe se tornava demasiadamente carinhosa. – Nada. Simplesmente estou feliz, tenho tirado boas notas, o que é raro…e estava aqui a pensar: Não te sentes pequena se pensares que Deus não existe, ou melhor, não te sentes poderosa se pensares que és uma parte de Deus? - Não comeces com as tuas conversas filosóficas! Tens a certeza que é só isso?Claro que sim mãe, não te armes em santo António casamenteiro novamente! – Responde Chico em tom de brincadeira. - Ok chiquinho, não te chateio mais. – Paula fechou a porta com um sorriso, e Chico pensou mais uma vez na menina do sorriso lindo, como ele se atrevera a chamar Sara na sua última "sms" de boa noite.
Sara foi a primeira pessoa que Chico viu na manhã seguinte, porém não da forma que gostaria de ver. Lá estava ela a falar sorridente e aparentemente feliz com o seu colega Afonso. Bom dia Sara! – exclamou Francisco, fingindo ignorar Afonso que lhe acenou em vão.
Porque é que o ignoras-te? – Perguntou Sara de cara séria a Francisco que comia um gelado fazendo-se parecer despreocupado – Passou despercebido miúda, que é queres? – Francisco não queria fazer notar o seu coração que batia descompassadamente, enquanto ele observava o cabelo negro de Sara que nesse dia estava surpreendentemente mais brilhante e bonito.
Gosta de ti! Mas…Oh Sara não tens de fazer um filme com isso, és uma miúda bonita, inteligente, culta, não és fútil. Conhecendo o Chico como eu conheço, ele deve estar farto de “morangadas”, e talvez esteja interessado numa relação séria. Não menosprezes os sentimentos do rapaz! – Exclamou Íris arregalando os olhos, depois de Sara lhe contar a nova atitude de Chico. Achas que deva falar com ele? – Questionou Sara, enquanto pegava no telemóvel – olha! Outra mensagem dele! – Exclamou. Não sei…- Respondeu Íris. – Talvez…mas tem cuidado, fala coerentemente, não te arrisques a perder uma amizade de anos.
Sim é verdade Sara, sinto algo que nunca senti antes…- Francisco ainda não estava a acreditar que Sara acabara de descobrir o seu recente sentimento em relação a ela. Eu não vou mudar de atitude perante a tua amizade Chico, só queria confirmar! – Exclamou Sara constrangida com o embaraço do rapaz. Eu sei, por isso é que fui sincero contigo! – retorquiu ele.
Passaram-se meses, e apesar da conversa entre Sara e Chico ter sido extremamente sincera e leal, a relação de amizade dos dois não voltou a ser a mesma. Afastaram-se ambos, e assim Francisco sentiu a “paixoneta” por Sara arrefecer gradualmente.
Chegaram finalmente as férias de Verão, e Sara estava radiante com a notícia dos pais:
Férias na Austrália? Uau mãe!
E assim se passaram duas semanas inesquecíveis na companhia dos pais, que lhe deixavam passear pelo hotel á noite. Sara adorava as noites de Karaoke, e a facilidade com que havia feito novos amigos ajudara-lhe imenso a passar as melhores férias da sua vida. Bryan, o rapaz mais extrovertido do grupo de amigos de verão fazia-lhe lembrar Francisco, e estranhamente o seu estômago dava uma volta sempre que se lembrava do amigo. Mas o último dia tinha chegado…- Mostra o cartão do hotel ao senhor no balcão, filha.Disse o pai á rapariga que deitava distraidamente um último olhar ao hotel. Sara!!! Sara! – Era a voz de Francisco! E lá estava ele, junto da escadaria do hotel. Sara correu ao seu encontro. – Francisco? Tu aqui? – Não sabia porquê, mas a felicidade e adrenalina tinham tomado conta do seu íntimo, e com a excitação, Sara nem tinha reparado na rapariga loira que estava ao lado do rapaz. Sara, é a minha namorada, Matilde, esta é a minha amiga sara!Prazer! – responderam as duas em uníssono. Após o trio se despedir, Sara juntou-se aos pais, e abandonou o hotel.
O avião levantou voo, e os seus olhos foram invadidos pelas lágrimas de desilusão. Fui tão estúpida! – pensou ela, enquanto amachucava raivosamente o desenho que pormenorizadamente traçava durante a viagem, e que por vezes voltava a retocar. Era o rosto de Francisco que acabava de ser destruído pelas suas mãos, mas não pelo seu coração.

1 comentário:

Balbino disse...

"Tu nunca choras ao ver sangue
Tu nunca ficas transparente
És daquela raça tão rara
Que tem no olhar o gelo quente"

Sangue Frio, Clã